"Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes que aqui caleidoscopicamente registro." Clarice Lispector


quinta-feira, 1 de julho de 2010

NORMOSE...

Todo mundo quer se encaixar num padrão.
Só que o padrão propagado não é exatamente fácil de alcançar.


Quanto mais a vida se torna truculenta, mais necessidade temos de buscar paz de espírito, o que explica o interesse crescente por crenças como o budismo e práticas como a ioga, que, cada uma a seu modo, procuram trazer a pessoa de volta para seu eixo interno, para um estado de relaxamento e de encontro com a felicidade através das coisas mais simples.
Lendo uma entrevista do professor Hermógenes, 86 anos, considerado o fundador da ioga no Brasil, ouvi uma palavra inventada por ele que me pareceu muito procedente: ele disse que o ser humano está sofrendo de "normose", a doença de ser normal.
Todo mundo quer se encaixar num padrão.

Só que o padrão propagado não é exatamente fácil de alcançar.

O sujeito "normal" é magro, alegre, belo, sociável, e bem-sucedido.

Quem não se "normaliza" acaba adoecendo.

A angústia de não ser o que os outros esperam de nós gera bulimias, depressões, síndromes do pânico e outras manifestações de não-enquadramento.

A pergunta a ser feita é: quem espera o que de nós?

Quem são esses ditadores de comportamento a quem estamos outorgando tanto poder sobre nossas vidas? Eles não existem. Nenhum João, Zé ou Ana bate à sua porta exigindo que você seja assim ou assado. Quem nos exige é uma coletividade abstrata que ganha "presença" por intermédio de modelos de comportamento amplamente divulgados. Só que não existe lei que obrigue você a ser do mesmo jeito que todos, sejam lá quem forem todos.

Melhor se preocupar em ser você mesmo. A "normose" não é brincadeira. Ela estimula a inveja, a auto-depreciação e a ânsia de querer o que não se precisa. Você precisa de quantos pares de sapato? Comparecer a quantas festas por mês? Pesar quantos quilos até o verão chegar? Não é necessário fazer curso de nada para aprender a se desapegar de exigências fictícias. Um pouco de auto-estima basta.

Pense nas pessoas que você mais admira: não são as que seguem todas as regras bovinamente, e sim aquelas que desenvolveram personalidade própria e arcaram com os riscos de viver uma vida a seu modo. Criaram o seu "normal" e jogaram fora a fórmula, não patentearam, não passaram adiante. O normal de cada um tem que ser original.

Não adianta querer tomar para si as ilusões e desejos dos outros. É fraude. E uma vida fraudulenta faz sofrer demais. Eu não sou filiada, seguidora, fiel, ou discípula de nenhuma religião ou crença, mas simpatizo cada vez mais com quem nos ajuda a remover obstáculos mentais e emocionais, e a viver de forma mais íntegra, simples e sincera. Por isso divulgo o alerta: a normose está doutrinando erradamente muitos homens e mulheres que poderiam, se quisessem, ser bem mais autênticos e felizes.

E VOCÊ, O QUE ACHA DA NORMOSE??

Martha Medeiros
Texto publicado no Jornal Zero Hora, de Porto Alegre, em 05/08/2007


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